Alimentação e cancro: a dieta pode ajudar na prevenção?
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Indíce
- 1. Carne vermelha vs. Cancro
- 2. Carne processada vs. Cancro
- 3. Carne grelhada vs. Cancro
- 4. Álcool vs. Cancro
- 5. Acrilamida vs. Cancro
A relação entre alimentação e cancro é um tema que gera muitas dúvidas e mitos. Embora alguns alimentos possam aumentar o risco, é fundamental basear as nossas escolhas alimentares em evidências científicas sólidas.
Segundo a Harvard T.H. Chan School of Public Health, cerca de 25% dos casos de cancro nos Estados Unidos da América, poderiam ser prevenidos através de uma alimentação mais saudável.
A American Cancer Society corrobora essa afirmação, apontando que o excesso de peso, a obesidade e a má nutrição estão ligados a 18% de todos os casos de cancro.
Mas como a alimentação pode influenciar o risco de cancro? O excesso de peso, por exemplo, está associado a um desequilíbrio hormonal que pode promover o crescimento de células cancerígenas. Além disso, alguns componentes presentes em alimentos ultraprocessados e carnes vermelhas podem aumentar o risco de determinados tipos de cancro.
Neste artigo, vamos perceber, com base em estudos científicos, que tipos de cancro são esses e se há alguma dieta específica que possa ajudar a prevenir doenças cancerígenas.
Está provado que a carne vermelha pode causar cancro?
Em 2015, a International Agency for Research on Cancer, que faz parte da Organização Mundial da Saúde, chegou à conclusão de que as carnes vermelhas (como carne bovina, suína e cordeiro) são "provavelmente carcinogénicas para humanos" (Grupo 2A).
As evidências são mais limitadas, mas, ainda assim, significativas.
Os especialistas concluíram que cada porção de 50 gramas de carne processada ingerida diariamente aumenta em 18% o risco de uma pessoa desenvolver cancro colorretal.
Embora os estudos com animais e laboratoriais não possam provar diretamente que o consumo de carne vermelha causa cancro em humanos, ajudam a explicar os mecanismos biológicos que poderiam justificar as observações feitas em estudos epidemiológicos.
Ou seja, a evidência é mais forte em termos de associação e menos conclusiva em termos de causalidade direta.
Para reduzir o risco de cancros digestivos, é aconselhável limitar ou excluir carnes vermelhas e processadas, bebidas com açúcar, alimentos altamente processados e produtos de grãos refinados.
Como se desconhece a quantidade ‘segura' de consumo de carne vermelha, é recomendável optar por proteínas como peixe, frango e leguminosas, sempre que possível.
A carne processada pode aumentar a probabilidade de cancro?
Sim.
A carne processada (bacon, salsichas ou presunto) resulta de processos como a cura, defumação ou fermentação, sendo mais comummente feitos em carne de porco ou bovina, frango e peru.
Este tipo de carne é um carcinoma do grupo 1 e, à semelhança da carne vermelha, o seu consumo pode aumentar o risco de cancro colorretal.
Apesar de existirem muitos estudos observacionais e revisões de alta qualidade que sugerem uma associação entre o consumo de carne vermelha, especialmente carne processada, e o aumento do risco de cancro, não existem estudos randomizados duplos-cegos que possam afirmar uma relação causal definitiva.
O facto de o estudo anterior realizado em ratos sugerir a associação não torna essa afirmativa cientificamente válida.
Grelhar carne pode ser um fator de risco para cancro?
Sim.
Grelhar ou queimar carne, aves ou peixes a altas temperaturas por um longo período pode levar à formação de aminas heterocíclicas (AH).
As AH podem causar danos genéticos e aumentar o risco de cancro do estômago e colorretal. Várias investigações epidemiológicas demonstraram uma correlação positiva entre as AH e o risco de cancro.
Para reduzir a probabilidade de desenvolver estes tipos de cancro, é recomendável evitar grelhar a carne a altas temperaturas, tanto de aves como de peixes.
Assim, para reduzir a quantidade de material carbonizado ou queimado que permanece na comida, é preferível:
- Untar, suavemente, a grelha com óleo;
- Esfregar a grelha após cada utilização;
- Baixar a temperatura, espalhando as brasas uniformemente ou aumentado a distância entre os alimentos e as brasas;
- Cortar a gordura da carne, o que pode reduzir a exposição a hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (possíveis causadores de cancro), que se formam quando a gordura escorre na fonte de calor.
O cancro pode ser potenciado pela ingestão de álcool?
Sim, sendo que o risco é proporcional à quantidade e à frequência do consumo.
O consumo de álcool causa acumulação de acetaldeído, um subproduto tóxico do etanol (álcool puro). No fígado, o etanol é convertido em acetaldeído e uma grande presença deste interrompe o processo de ligação do ADN.
Ou seja, as células não se desenvolvem corretamente. O consumo de álcool também causa danos aos tecidos, tornando as células superficiais mais suscetíveis à absorção de carcinomas.
Existe um forte consenso da comunidade científica de que o uso de álcool pode causar vários tipos de cancro, sendo classificado como um carcinoma do grupo A pela IARC - International Agency for Research on Cancer.
Taxas de probabilidade de desenvolver cancro devido ao excesso de consumo de álcool
Segundo o National Cancer Institute dos EUA, quem consome bebidas alcoólicas em excesso tem uma maior probabilidade de desenvolver certos tipos de cancro do que quem não bebe.
As probabilidades variam consoante o tipo de cancro:
- Cabeça e pescoço: em pessoas que ingerem álcool de forma moderada, o risco de cancro da cavidade oral e faringe aumenta em 1,8 vezes; e o risco de cancro da laringe aumenta 1,4 vezes. Já as pessoas que bebem em excesso têm um risco 5 vezes acrescido de desenvolver cancro da cavidade oral e faringe e um risco 2,6 vezes maior de vir a sofrer de cancro da laringe;
- Esofágico: o risco aumenta de 1,3 em consumidores moderados para 5 vezes em consumidores que ingerem álcool excessivamente;
- Fígado: o consumo excessivo de álcool está associado a um risco duas vezes maior de dois tipos de cancro do fígado (carcinoma hepatocelular e colangiocarcinoma intra-hepático);
- Mama: o risco de cancro da mama é maior em consumidores moderados ou que consomem álcool em excesso;
- Colorretal: o risco de cancro do cólon e do reto pode ser 1,2 a 1,5 vezes superior em pessoas que consomem álcool, em comparação com a ausência de consumo.
O consumo de álcool deve ser moderado. Isso significa uma bebida por dia para o sexo feminino e até duas bebidas para o sexo masculino.
No sexo feminino, define-se o consumo excessivo de álcool como oito ou mais bebidas por semana. Para os homens, este excesso é caraterizado como quinze ou mais bebidas semanais.
A acrilamida pode provocar cancro?
Para já, não há evidências.
A acrilamida é um produto químico utilizado em processos industriais e em produtos de consumo, como embalagens de alimentos.
Este químico está presente em batatas fritas, salgados, bolachas, pão e azeitonas pretas. Uma fonte de exposição elevada à acrilamida é o fumo do tabaco.
A alegação de que a acrilamida é provavelmente cancerígena para as pessoas é amplamente baseada em estudos com animais. São, por isso, necessárias mais investigações para afirmar, conclusivamente, que este químico aumenta o risco de cancro.
Uma dieta alcalina pode prevenir o cancro?
Não há evidências de que o consumo de alimentos alcalinizados possa prevenir o cancro.
Na química, a escala de pH é uma medida de quão ácida ou básica uma solução é. A escala de pH varia de 0 a 14, sendo que 7 é neutro, menos de 7 é ácido e maior que 7 é classificado como pH básico.
Não existem estudos epidemiológicos em seres humanos que tenham investigado a relação entre pH e cancro, nem evidências laboratoriais de que o pH ácido aumente o risco de cancro.
Embora seja verdade que as células cancerígenas se desenvolvam em ambientes ácidos, um artigo medicamente revisto reforça que os ácidos de pH no corpo humano não são determinados pelos alimentos consumidos.
Há alimentos que podem ajudar a prevenir o cancro?
Não há alimentos que afastem este problema de saúde permanentemente.
No entanto, uma revisão de evidências sobre uma potencial dieta ‘anticancro' sugere que esta poderia incluir algumas das seguintes caraterísticas:
- Rica em fibras;
- Rica em ácido fólico;
- Rica em antioxidantes e fitoquímicos de fruta e vegetais;
- Sem carne vermelha;
- 2 a 3 porções de fruta diariamente;
- 10 ou mais doses de vegetais por dia, incluindo vegetais crucíferos;
- Baixo teor de gordura total, mas com inclusão de ácidos gordos essenciais;
- Sem açúcar ou farinha refinada;
- Calorias adequadas e não excessivas;
- Exposição a luz solar para obter vitamina D;
- Proporção equilibrada de ómega 3 e ómega 6;
- Suplementação com probióticos benéficos e enzimas orais, mediante orientação médica;
- Inclusão de sementes de linhaça como fonte de fitoestrógenos.
A mesma revisão aponta reduções de 60% nas taxas de cancro da mama demonstradas em investigações de dieta humana, assim como uma redução de 71% nas taxas de cancro do cólon para homens.
Isso, naturalmente, sem os fatores de risco modificáveis amplamente conhecidos.
A alimentação e cancro estão intrinsecamente relacionados, uma vez que a dieta é um dos fatores-chave para a formação e prevenção do cancro.
Segundo a ciência, a contribuição calórica da gordura não deve ser maior que 30% da ingestão calórica total. Isso é possível ao reduzir a ingestão atual de gordura em 18%.
O consumo de carboidratos e alimentos que contenham fibras deve ser duplicado e, em vez de grandes refeições, é aconselhável seguir uma dieta rica em fruta e vegetais.
Podem não existir alimentos ‘anticancro', mas seguir uma dieta saudável e equilibrada pode reduzir o risco cancerígeno.